Aqui por Angola não há assim muito para contar. A corrupção política, a incapacidade dos funcionários, tudo normal.
Andei a ler os jornais a ver se havia algo de interesse para os leitores do “Mexerico”, até que me lembrei do que se passou em Luanda há umas semanas atrás. Caso muito discutido. Um tal de Domingos Jorge saía todos os dias de casa vestido de polícia de trânsito. Ia para o trabalho. Só que ele não era polícia nenhum. Isto já desde à meses.
Estava uniformizado a rigor, como mandam os cânones do bom atavio castrense, isto é camisa, sapato bonito, colete calça bem vincada e, inclusive, uma pistola no coldre. Na cara redonda um sorriso bonacheirão, olho grande a inspirar confiança.
Já há meses que o Domingos era uma constante na via pública no interior do Bairro Popular. Durante este tempo cometia vários disparates. “Havia dias em que ele ordenava a circulação de duas vias convergentes em simultâneo e isso provocava acidente”, disse um dos taxistas que já foi vítima dos malabarismos do falso agente Domingos.
Ao fim e ao cabo este só dominava mesmo a extorsão de dinheiros aos automobilistas. “Ah! nisso ele era bom...não cobrava menos de 1.500 Kwanzas por cada infracção que detetava” confidenciou outro motorista.
Todos os dias comentava-se sobre um suposto agente que morria de amores pelo interior dos bairros, onde, quase que ao virar dos ponteiros do relógio, fazia novas vítimas.
Por fim foi apanhado pela própria Polícia Nacional em flagrante quando uniformizado se encontrava a desorganizar o trânsito e a retirar muito dinheiro do bolso dos taxistas e demais automobilistas. No momento da prisão exigia de um motorista alguns trocados. Agora encontra-se a contas com a Justiça.
No entanto é preciso dizer que o Domingos ganhou muitos simpatizantes. Na tasca do Mané Cabomba ouvi comentários como este: “O Domingos só estava a safar a onça…hehehehe… até que caíu nas malhas…da outra parte astuciosa, tenho dito”. Ou: “já apanharam o falso polícia? Ok, bom trabalho. Agora têm também que apanhar o falso professor, o falso economista, o falso ministro, o falso deputado, o falso Director e até o falso Presidente. São tantos os falsos no nosso país que já não se sabe quem è verdadeiro”.
O meu comentário a respeito disto tudo è: Haverá falsos polícias, falsos médicos, falsos motoristas, falsos deputados e políticos. O facto è que podereis ter a certeza que estará a chegar o dia do Juízo Final. Mas também haverá falsos profetas como eu!
Aqui Angola, José Dias Branco.
segunda-feira, 7 de maio de 2007
O falso polícia
Poesia Agro-Marítima
A Àguia tem o ninho alto
A perdiz tem ninho baixo
O gato não tem ninho
Nem alto nem baixo.
Zé da Eira-cavador
Fui pro mar à pesca do safio
Levava rede e muito fio
Vi mas foi a espanholada
A roubar a nossa pescada.
José da Chata-pescador
Levo pelo monte cabra e ovelha
Vivo livre sem telha
Quando chove fico molhado
Quando faz sol todo suado.
Jaquim Cabrita-Pastor
Comi tanto chouriço e pão
Que emborquê um garrafão
Pr’ajudar a empurrare,
Fiquê três horas a vomitare
Detê-me na palha ali posta
para ver se descansava
enterrê-me logo em bosta
de uma vaca que passava.
Foi assim que essa tarde
conheci um caracoli
os dois deitados na palha
c’os cornos a secare ao soli.
anónimo alentejano
De mau humor
O Freitas! O Freitas esse cão danado! Quando abre a boca sai um chorrilho de asneiras e banalidades. Gostava de saber o que é que ele tem naquela bola que está em cima do pescoço! É que nem para enfeite serve!
Vocês não conhecem o Freitas! Além da cabeça vazia tem-me cá um bafo! È um cheiro a alho podre e coentros sêcos.Senta-se ao teu lado no café, inclina-se na tua direcção porque te quere contar uma mexericada e tu apanhas logo com aquele bafo fedorento. Fazes das tripas coração para não vomitares logo ali. O suor escorre-lhe pela visage bolachuda. Quando a bica chega leva a chávena aos lábios e vai de sorver o café emitindo ruídos como os de um aspirador velho. Não demora muito e logo fica com uma “medalhas” castanhas na camisa branca. A barriga cai farta sobre o cinto que com dificultade segura ums calças cheias de nódoas!
Mas o que mais me irrita são as histórias que conta, um mal-dizer permanente de tudo e de todos, as mentiras sem fim, as piadas que dão dor de coração.
Outro dia por exemplo, tive de me conter para não lhe dar uma arrochada na fuça. Chegou à mesa, sentou-se e sem mais nem menos começou logo a irritar os nossos ouvidos com aquela voz de castrado:
-“ Vocês sabem, já vos havia falado nele, no meu tio que estava em Angola. Pois já não está! Chegou anteontem e ontem fomos jantar. Fartou-se de contar coisas sobre Angola. Vocês sabem como é que ele caçava leões? Pois é muito simples. Até eu fiquei parvo. Quando o leão abria a boca para morder, o meu tio enfiava muito rápido a mão pelas goelas abaixo, até chegar ao rabo, dava um esticão forte e o leão ficava do avesso. AH! AH! O riso alvar entoava por todo o café, nós entreolhavamo-nos numa comunicação muda como que querendo dizer: “até quando suportamos esta besta”. Mas ele tinha andado conosco na escola. Alguém de nós manda-o calar mas todos sabemos que o sol é de pouca dura. Aquele monte de banhas é o Freitas e há-de ser sempre o Freitas. Não muda mais. E assim lá o vamos suportando.
Eu fico sempre de mau humor mas volto sempre ao café, àquela mesa onde se senta o Freitas. È que o Freitas também serve de bombo de festa onde podemos descarregar a nossa por ele provocada agressividade.
Brigida Linda
Gosto das rãs
Eu gosto muito das rãs. Especialmente nas noites quentes de verão quando deitado na cama, a janela aberta, fico a olhar a lua cheia e a pensar na minha Belarmina. Oiço as rãs. Elas arrotam a noite toda. São mais pequenas que uma vaca e não dão leite. São maiores que uma formiga e não gostam de migalhas.
Em tempos que já la vão houve uma rã que quiz ser maior que um boi, pelo meno era o que contava a minha avó. Todos sabemos o que se passou: rebentou e foi logo para o “Grande Charco Eterno”.
As rãs são batráquios e gostam muito de nadar. Eu gosto mais de nadar na piscina do que no mar, por causa das ondas, que são muito chatas. As rãs gostam mais de nadar nos charcos onde também põem os ovos e fazem as suas necessidades. Há muitas espécies de rãs mas eu gosto mais das que vivem nos nossos charcos. Quando nascem chamam-se girinos. Não são nada giros. Têm uma cabeçorra enorme e uma cara parva. São uma espécie de peixes porque respiram por guelras e não têm escamas nem espinhas. Só quando chegam à puberdade é que se transformam em rãs. Só falta dizer que os sapos não são os maridos das rãs mas sim os ranos machos.
sábado, 5 de maio de 2007
Alentejo: Chuva, Chuva
Os alentejanos haviam entretanto descoberto a batata, o trigo, a bolota, a vinha e o pasto, que crescem sem necessidade de água. Outra grande descoberta foi o plantar a larangeiras sempre em grupos de três, muito juntas. Assim têm logo trinaranjus para os putos. Quanto ao leite nunca tiveram problemas: as vacas alentejanas adaptam-se à seca e passaram a dar leite em pó. No que diz respeito a eles próprios haviam substituído a àgua pelo vinho. Bebem vinho, cozinham com vinho, lavam-se com vinho. Tempos felizes que ameaçam chegar ao fim. Os mais novos nunca haviam visto àgua. Quando as nuvens começaram a despejar cairam em pânico. Uns esconderam-se debaixo cama, outros subiram para os telhados e muitos corriam de um lado para o outro, sem destino, monologando aturduídos: “Que tal está a moenga, compadri”!
Os mais religiosos fugiram para a Igreja a rogar a Deus que transformasse aquilo que caía do céu em vinhaça. Desde há dois dias que o Alentejo é um pandemónio.
E os meteorologistas afirmam a pés juntos que vai continuar a chover.
Explicam que devido ao aquecimento extremo, a corrente do Golfo alterou o seu curso e agora vai direitinha à costa alentejana. Ela transporta muita humidade e assim ocasiona chuva, chuva e mais chuva.
A propósito de chuva: quando estava hoje de manhã em Évora a fazer a reportagem vi um alentejano no passeio debaixo de uma goteira. A àgua caía a jorros sobre ele. Aproximei-me e perguntei: -“Oh! Amigo, porque na troca de lugar”? Responde ele muito calmo:
-“Eu cá trocava, mas com quem”?
Porque é que?
A ciência investiga e descreve a realidade, a filosofia ocupa-se da resposta ao “porque é que...”.
Por exemplo: Porque é que demora mais a chegada de uma ambulância que a entrega de uma pizza ao domicilio?
São questões filosóficas como esta que ocupam alguns filósofos da Universidade de Trás-os-Montes. Assim elaboraram uma lista de perguntas cruciais para o ser humano. Cruciais no sentido de demonstrar que o ser humano é em principio uma contradição em si.
Porque é que as pessoas pedem um “cheesburger” com uma grande dose de batatas fritas e uma “Coca-Cola” lights?
Porque é que o sumo de limão contém aromas artificiais deste fruto e o produto para a máquina de lavar loiça é produzido à base de sumo de limão natural?
Ou esta: Porque é que os pilotos kamikatze usavam um capacete?
Eu, cá por mim, só gostava de saber porque é que o idiota do Noé não aplastrou o casal de mosquitos que tinha lá na arca?