domingo, 24 de junho de 2007

JULIO BARROSO TREINADOR E BON VIBANT

Naquele dia de chuva só apetecia ficar em casa. No entanto o dever chamava a altos gritos. Não podia deixar para ali o dever a berrar. Até porque o meu vizinho é muito chato em tudo o que se refere a barulhos. Mal humorado enfiei-me na gabardine e pus o chapéu nos cornos. Saí para a rua. Chovia a cântaros. Meti as patas em várias poças de àgua. Fiquei danado. Caraças de dia para ir entrevistar um treinador de futebol, ainda que de uma grande equipa. A praguejar entrei no carro, um Diane todo artilhado. Vocês estão a ver: carro de intelectual... e jornalista é intelectual. Filosofia, politica, futebol... percebe de tudo. O para-brisas esfalfava-se na luta inglória contra a chuva. Eu não via quase nada. Porra! Já ia a entrar no Areeiro, vindo da Almirante Reis quando descortinei a Cervejaria “Munique” à minha esquerda. O treinador que se vá lixar! Vou mas é dar cabo de um bitoque com ovo a cavalo e entornar umas canecas. Dei a volta à praça e arrumei a Diane em cima do passeio, em frente à “Pensão do Areeiro”. Cheguei à cervejaria a escorrer àgua bem molhada. Que algazarra. Quando se trata de comer e beber não há pai para os lusitanos. Estão a comer e a maioria das conversas rondam a comida: “Eh! pá! outro dia fui a Salvaterra...nem queiras saber... comi lá um ensopado de enguias! e o vinho... era cá uma pomada!”
Por fim lá descobri uma mesa livre, ao fundo da sala, junto à janela. Apressei o passo não fosse algum esperto adiantar-se e no último segundo surripiar-me a mesa. Pelo canto do olho ainda vi como dois tipos anafados tentavam cortar-me o caminho. Fazendo de conta que os não tinha visto, desviei uma cadeira da mesa anterior, cortando-lhes assim o atalho.
-“Comigo não amigos! eu não nasci ontem”, pensei cá para comigo. Lusitano com fome não aceita a derrota! Lançaram uns comentários nada apetitosos para o ar, mas eu fizde conta que era surdo...o que os irritou ainda mais. Mantive-me impassivel como a rocha face ao mar bravo. Lá se foram a resmungar e eu fiquei à espera do empregado o senhor Meirinho. Quando este chegou fiz logo o pedido e disse-lhe: “Oh! Senhor Meirinho defenda-me esta mesa enquanto for à casa de banho”!
Posso tomar banho um só vez por semana mas antes de comer tenho sempre de lavar as patas.
Quando ia a chegar às escadas que levam à casa de banho, descobri-o numa mesa meio-escondida. Lá estava ele o grande treinador. A seu lado uma loira espanpanante. E não era a esposa!
-“Ah! Malandro! O gato anda às filhoses e a entrevista comigo serviu de desculpa! Espera que já te digo, i will tell you como dizem os ingleses!”
Dirigi-me directamente para a mesa e cumprimentei:
-“Boa noite senhor treinador” e voltando-me para a loira “boa noite senhora....” ela completou com um sorriso muito profissional: -“Anabela, artista”!
“Sim esta sabe-a toda, artista... artista no “Elefante Branco” é o que tu és!” pensei cá para comigo. O grande treinador mais parecia um guarda-redes antes do penalty. Podia ver o medo a nadar nos seus olhos. Ele sabia que eu sabia que a Anabela não era a sua esposa. A custo tartamudeou: “Oh! Desculpe ter esquecido a entrevista mas é que tenho tanto que fazer e ainda por cima o meu bloco de notícias electrónico na tinha bateria... podemos adiar para amanhã, digamos à uma da tarde? Podiamos almoçar juntos...”
“Okay, okay” – retorqui, “amanhã à uma no “Tavares Rico”, está bem?” Ele aceitou. Que remédio. E eu já sabia quem ia pagar o almoço!
Fui lavar as mãos e preparei-me para atacar o bitoque e umas canecas, antegozando o repasto no “Tavares Rico”.
Afinal o dia na correu assim tão mal.
Pedro Ferrenho

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